19 de março de 2021

 


OS ENGENHOS DE FARINHA DE MANDIOCA DA ILHA DE SANTA CATARINA – Etnografia Catarinense

Dia 12 de março de 2021, terminei a leitura do meu 6º livro do ano, de Nereu do Vale Pereira

 OS ENGENHOS DE FARINHA DE MANDIOCA DA ILHA DE SANTA CATARINA – Etnografia Catarinense

/ Nereu do Vale Pereira. Florianópolis : Fundação Cultural Açorianista, 1993.  208p: il.

Este livro tem como abordagem, um levantamento etnográfico sobre a cultura açoriana estabelecida na Ilha de Santa Catarina, cidade de Desterro, atual Florianópolis após a vinda de Imigrantes Açorianos, a partir de 1748, trazendo o uso dos engenhos que aqui foram adaptados, para a fabricação da farinha de mandioca na ilha.

Falar sobre os Engenhos de farinha para mim é relembrar histórias contadas no âmbito da minha família mesmo nós não temos nascidos na região de Florianópolis e sim do médio Vale do Itajaí. Lembro perfeitamente de ouvir minha mãe e meu avó falarem dos trabalhos que eles prestavam em um Engenho de farinha e possivelmente de cana também (este com a finalidade de fazer açúcar grosso e melado), de um tio da minha mãe que tinha um pouco mais de recursos.

O meu avô materno uma pessoa de quase dois metros de altura nos contava que o cunhado sempre pagava a mais para ele porque ele “rendia” bem mais que os outros que trabalhavam a “jornal” ou seja, por jornada, já a minha mãe contava que quando criança ajudava no engenho do tio e depois “ganhava” umas bonequinhas de açúcar (não sei exatamente o formato e a quantidade), mas a lembrança era bem real e passada de forma feliz.

Voltando ao livro de Nereu do Vale Pereira, sobre os Engenhos de Farinha de Mandioca na Ilha de Santa Catarina, podemos ver que na segunda metade do século XVIII, logo depois que a primeira leva de casais açorianos aqui chegaram por meio de um projeto de colonização da Coroa Portuguesa, até para livrar os habitantes das Ilhas dos Açores da fome extrema que assolava a região.

Os engenhos que lá eram utilizados com outras finalidades devido a mandioca não ser um produto do Continente Europeu, logo foram adaptados ao ambiente de produção e recursos disponíveis locais na ilha. Adaptando os engenhos e com uma grande produção de mandioca na ilha logo a farinha de mandioca se torna o principal produto de exportação não somente da ilha bem como de toda a Província de Santa Catarina durante a o final do século XVIII e por quase todo o século XIX. Somente Desterro chegou a ter aproximadamente oitocentos engenhos de farinha de mandioca.

Por ser a farinha de mandioca um produto de fácil manufatura uma grande quantidade de residências do interior da ilha, tinham um engenho junto a casa de moradia, tendo em vista que esta unidade de produção não ocupava muito espaço e a mão de obra era quase que totalmente familiar. Quando do período da farinhada ou de fazer farinha se usava também a mão de obra de vizinhos e parentes que raramente recebiam em dinheiro por esse serviço e sim em troca de dia ou mesmo em parte da produção.

Por mais interessante que venha a ser a produção de um engenho de farinha na ilha poderia ter peculiaridades diferentes entre si em localidades diversas, tendo em vista que o modo de fazer o engenho estava na cabeça do mestre que seria responsável pela sua execução, bem como os recursos disponíveis como tipo de madeira e espaço disponível. Não existia uma planta única que fosse utilizada para uso em escala até porque a maioria dos mestres que os construíam eram praticamente pessoas analfabetas, mas com grande capacidade de execução.

Por questões de relevo quanto aos rios e regatos um tipo de engenho muito conhecido para o interior do estado não teve aceitação localmente, que é o engenho movido a roda d´agua, dando lugar aos engenhos movidos a boi. O boi como elemento essencial de tração era responsável por movimentar os equipamentos que se encaixavam um ao outro por intrincados mecanismos totalmente feitos a mão e em madeira.

Domar e treinar o boi para uso na canga era uma atividade que levava vários meses, pois o animal, tinha que estar completamente adaptado ao ambiente e com os equipamentos corretos para o árduo e contínuo trabalho no engenho e se alguma coisa fugisse do controle poderia acabar destruindo todo o equipamento.

Produzir farinha de mandioca não era uma tarefa exclusiva da Ilha de Santa Catarina, tendo em vista que em várias regiões da Província e também do país tinham produção, porém em escala muito menor e ainda não com a mesma qualidade. Na verdade, a produção de farinha já era realizada a muito tempo pelos primeiros habitantes dessa terra, ou seja, os nossos indígenas, claro que em um processo muito rudimentar para atender as suas necessidades básicas de alimentação.

Ao decorrer do livro de Nereu do Vale Pereira, são apresentados desenhos, plantas e escalas de como eram produzidos os engenhos bem como suas peças e suas diversas funcionalidades eram produzidos. Também muitas fotografias mostrando os diversos engenhos ainda existentes quando da pesquisa realizada desde a década de sessenta ao final da década de oitenta do século passado e também toda a sociabilidade que a Farinhada ou fazer farinha permitiam nos frios dias de inverno.

A atividade de produção de farinha de mandioca conforme conhecemos, começou o seu ciclo final a partir de 1963, quando começam a chegar os primeiros engenhos elétricos que passam a produzir de forma praticamente industrial e começam a usar o nome de Fecularias. Com a mecanização praticamente se encerra a atividade artesanal, familiar e de grande congregação social nas localidades da atual Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina.

Acredito que de uma forma ou de outra, todos nós temos em um passado não muito distante, através dos nossos ancestrais um forte convívio com a farinha de mandioca como base de alimentação ou mesmo de comércio, conforme já citado no texto devido este produto ser o principal item de exportação da Província de Santa Catarina.

A finalidade deste texto é fazer um breve apanhado sobre o tema dos Engenhos de Farinha na Ilha de Santa Catarina, e recomendo aos que gostem e tenham interesse sobre o assunto, quer seja por interesse histórico e comercial ou mesmo de histórias familiares conforme foi o meu caso, que leiam o livro que acabo de descrever.

Grande abraços à todos.

 

Paulo Coelho – Administrador/Bacharel e Licenciado em História.

 Florianópolis – SC     19/03/2021.

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