OS ENGENHOS DE FARINHA DE MANDIOCA DA ILHA DE SANTA CATARINA –
Etnografia Catarinense
Dia 12 de março de 2021, terminei
a leitura do meu 6º livro do ano, de Nereu do Vale Pereira
OS ENGENHOS DE FARINHA DE MANDIOCA DA ILHA DE
SANTA CATARINA – Etnografia Catarinense
/ Nereu do Vale Pereira.
Florianópolis : Fundação Cultural Açorianista, 1993. 208p: il.
Este livro tem como abordagem, um
levantamento etnográfico sobre a cultura açoriana estabelecida na Ilha de Santa
Catarina, cidade de Desterro, atual Florianópolis após a vinda de Imigrantes
Açorianos, a partir de 1748, trazendo o uso dos engenhos que aqui foram
adaptados, para a fabricação da farinha de mandioca na ilha.
Falar sobre os Engenhos de
farinha para mim é relembrar histórias contadas no âmbito da minha família
mesmo nós não temos nascidos na região de Florianópolis e sim do médio Vale do
Itajaí. Lembro perfeitamente de ouvir minha mãe e meu avó falarem dos trabalhos
que eles prestavam em um Engenho de farinha e possivelmente de cana também
(este com a finalidade de fazer açúcar grosso e melado), de um tio da minha mãe
que tinha um pouco mais de recursos.
O meu avô materno uma pessoa de
quase dois metros de altura nos contava que o cunhado sempre pagava a mais para
ele porque ele “rendia” bem mais que os outros que trabalhavam a “jornal” ou
seja, por jornada, já a minha mãe contava que quando criança ajudava no engenho
do tio e depois “ganhava” umas bonequinhas de açúcar (não sei exatamente o
formato e a quantidade), mas a lembrança era bem real e passada de forma feliz.
Voltando ao livro de Nereu do
Vale Pereira, sobre os Engenhos de Farinha de Mandioca na Ilha de Santa
Catarina, podemos ver que na segunda metade do século XVIII, logo depois que a
primeira leva de casais açorianos aqui chegaram por meio de um projeto de colonização
da Coroa Portuguesa, até para livrar os habitantes das Ilhas dos Açores da fome
extrema que assolava a região.
Os engenhos que lá eram
utilizados com outras finalidades devido a mandioca não ser um produto do
Continente Europeu, logo foram adaptados ao ambiente de produção e recursos
disponíveis locais na ilha. Adaptando os engenhos e com uma grande produção de
mandioca na ilha logo a farinha de mandioca se torna o principal produto de
exportação não somente da ilha bem como de toda a Província de Santa Catarina
durante a o final do século XVIII e por quase todo o século XIX. Somente
Desterro chegou a ter aproximadamente oitocentos engenhos de farinha de
mandioca.
Por ser a farinha de mandioca um
produto de fácil manufatura uma grande quantidade de residências do interior da
ilha, tinham um engenho junto a casa de moradia, tendo em vista que esta
unidade de produção não ocupava muito espaço e a mão de obra era quase que
totalmente familiar. Quando do período da farinhada ou de fazer farinha se usava
também a mão de obra de vizinhos e parentes que raramente recebiam em dinheiro
por esse serviço e sim em troca de dia ou mesmo em parte da produção.
Por mais interessante que venha a
ser a produção de um engenho de farinha na ilha poderia ter peculiaridades
diferentes entre si em localidades diversas, tendo em vista que o modo de fazer
o engenho estava na cabeça do mestre que seria responsável pela sua execução,
bem como os recursos disponíveis como tipo de madeira e espaço disponível. Não
existia uma planta única que fosse utilizada para uso em escala até porque a
maioria dos mestres que os construíam eram praticamente pessoas analfabetas,
mas com grande capacidade de execução.
Por questões de relevo quanto aos
rios e regatos um tipo de engenho muito conhecido para o interior do estado não
teve aceitação localmente, que é o engenho movido a roda d´agua, dando lugar
aos engenhos movidos a boi. O boi como elemento essencial de tração era
responsável por movimentar os equipamentos que se encaixavam um ao outro por
intrincados mecanismos totalmente feitos a mão e em madeira.
Domar e treinar o boi para uso na
canga era uma atividade que levava vários meses, pois o animal, tinha que estar
completamente adaptado ao ambiente e com os equipamentos corretos para o árduo
e contínuo trabalho no engenho e se alguma coisa fugisse do controle poderia
acabar destruindo todo o equipamento.
Produzir farinha de mandioca não
era uma tarefa exclusiva da Ilha de Santa Catarina, tendo em vista que em
várias regiões da Província e também do país tinham produção, porém em escala
muito menor e ainda não com a mesma qualidade. Na verdade, a produção de
farinha já era realizada a muito tempo pelos primeiros habitantes dessa terra,
ou seja, os nossos indígenas, claro que em um processo muito rudimentar para
atender as suas necessidades básicas de alimentação.
Ao decorrer do livro de Nereu do
Vale Pereira, são apresentados desenhos, plantas e escalas de como eram
produzidos os engenhos bem como suas peças e suas diversas funcionalidades eram
produzidos. Também muitas fotografias mostrando os diversos engenhos ainda
existentes quando da pesquisa realizada desde a década de sessenta ao final da
década de oitenta do século passado e também toda a sociabilidade que a
Farinhada ou fazer farinha permitiam nos frios dias de inverno.
A atividade de produção de
farinha de mandioca conforme conhecemos, começou o seu ciclo final a partir de
1963, quando começam a chegar os primeiros engenhos elétricos que passam a
produzir de forma praticamente industrial e começam a usar o nome de Fecularias.
Com a mecanização praticamente se encerra a atividade artesanal, familiar e de
grande congregação social nas localidades da atual Florianópolis, capital do
Estado de Santa Catarina.
Acredito que de uma forma ou de
outra, todos nós temos em um passado não muito distante, através dos nossos
ancestrais um forte convívio com a farinha de mandioca como base de alimentação
ou mesmo de comércio, conforme já citado no texto devido este produto ser o
principal item de exportação da Província de Santa Catarina.
A finalidade deste texto é fazer um
breve apanhado sobre o tema dos Engenhos de Farinha na Ilha de Santa Catarina,
e recomendo aos que gostem e tenham interesse sobre o assunto, quer seja por
interesse histórico e comercial ou mesmo de histórias familiares conforme foi o
meu caso, que leiam o livro que acabo de descrever.
Grande abraços à todos.
Paulo Coelho –
Administrador/Bacharel e Licenciado em História.
Florianópolis – SC 19/03/2021.
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